Esta é da época em que ter telefone em casa era símbolo de status. Estava cobrindo um plantão de sábado sem muito assunto na editoria de Economia e fui incumbida de produzir uma matéria sobre uma feira que estava rolando numa rua próxima à redação. Detalhe que naquele tempo não se buscava informação na Internet – porque a ferramenta simplesmente não existia – e tampouco se costumava fazer entrevista pelo telefone – o papo das linhas caras e escassas que citei lá em cima acontecia até mesmo nos jornais.
Fomos andando até a tal feira, eu e o fotógrafo, suando debaixo de um calor absurdo de verão. Artesanato, biscoitos, aumento no preço, impostos, governo que não ajuda, crianças, caldo de cana, pastel, peixe. O dono da barraca, encantado com a ideia de poder embalar seu produto do dia seguinte com sua foto no jornal, presenteou a equipe de reportagem com tilápias frescas.
Já era perto da hora do almoço quando comecei a escrever a matéria. Ajeitei a máquina de escrever, acendi meu cigarro Free, fingi não ouvir o barulhão dos aparelhos de Telex postados no balcão atrás da minha mesinha. Um a um, os colegas iam chegando de suas respectivas entrevistas. Alguém ligou o ventilador. Flagrei um repórter discretamente conferindo se o desodorante estava vencido. E o cheiro da minha tilápia, dentro daquela sacola plástica que antigamente não rasgava fácil, nunca foi citado naquele quente plantão de sábado.
Beijos,
Karin Villatore