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3
abr

A arte imita a vida

aquele-que-caiCena do espetáculo “Aquele que cai”. Foto: Géraldine Aresteanu.

Tomo por ideia inicial um lugar comum, me perdoe. Precisamos de um ponto de partida para a viagem à qual te convido: um passeio pelas metáforas do espetáculo “Aquele que cai”, de Yoann Bourgeois. Se você não foi um dos sortudos convidados para a abertura da 28ª edição do Festival de Curitiba, no dia 26 de março, ou não esteve na plateia no dia seguinte, não tem problema. Se você é humano, o assunto lhe interessa. Antes de começar, peço que assista a um trecho da apresentação no Youtube.

Claro, a obra é aberta, não tem interpretação certa ou errada, mas vou compartilhar aqui o que ela significou para mim.

“Celui qui tombe” (o nome da peça em francês, seu país de origem) traz cinco personagens comuns, com roupas comuns e vidas aparentemente comuns. No início, eles estão em um lugar estranho (a plataforma – a meu ver, representação do mundo) e precisam se adaptar rapidamente ao ritmo ditado por ela, que gira – começa devagar, e vai aumentando a velocidade. É difícil se equilibrar sozinho, e em certo momento os cinco entendem que se ajudarem uns aos outros, conseguirão ficar em pé mais tempo e realizar mais coisas juntos. Logo, alguns casais se unem, se separam, e a plataforma gira cada vez mais rápido. Até que todos caem. Não é fácil se adaptar ao ritmo do outro e ao que o mundo exige de nós. Mas é importante aprender a levantar de novo, de novo e de novo.

Em outro momento, a plataforma é colocada sobre um único ponto de apoio, central. Como um prato apoiado em um palito. Torna-se ainda mais difícil encontrar o equilíbrio. Mas não podemos ficar inertes por muito tempo, ou somos engolidos pelo sistema: alguém vai se mexer, e se você ficar parado, cai. É preciso se adaptar rápido. Alguns personagens conseguem chegar a um ponto privilegiado e aproveitar a vista. Mas lembre-se, se todos se moverem para o mesmo lado da plataforma, caem. Alguns precisam ser o contrapeso – os privilégios infelizmente não são para todos.

Pouco antes do fim, os personagens estão no chão e a plataforma passa a se comportar como um pêndulo. Uma moça tenta empurrá-la sozinha: em vão, porque o mundo é muito pesado para ser carregado sozinho. Com a ajuda dos colegas de elenco, o pêndulo se move. Mas tudo o que vai, volta. E agora quem não se abaixa rápido o suficiente é empurrado pela plataforma. É preciso se movimentar, porque o mundo não para. Os personagens se abaixam, pulam, sobem na plataforma, deitam, fazem o que podem, mas invariavelmente, em algum momento são derrubados. Há quem caia e não levante mais, sem suportar o peso do mundo. E então todos ficam pendurados, segurando-se como podem, mas a verdade é que, no fim, todos caem.

E aí, se identificou? Qualquer semelhança com a vida real não foi mera coincidência. O Festival de Teatro de Curitiba vai até 7 de abril, domingo. Vá ao teatro, é bom ver a vida refletida na arte.

Luciana Penante

12
mar

8 espetáculos imperdíveis do Festival de Teatro

PI
Há 28 anos, o mês de março em Curitiba é sinônimo de correr atrás do Guia do Festival de Teatro, em busca das melhores peças para assistir durante as duas semanas em que a cidade respira artes cênicas. Sem qualquer pedantismo ou exagero, afinal são espetáculos espalhados pela capital, em praças e espaços públicos que vão além dos palcos tradicionais como Guairão, Positivo e Reitoria.

Como estudante de Jornalismo, depois repórter do jornal Metro e assessor na edição 2015, acompanho o Festival há nove anos. Para te ajudar a escolher o que assistir em meio a tantas opções, selecionei seis espetáculos da Mostra Oficial – que segue a curadoria afiada de Márcio Abreu e Guilherme Weber desde 2016 – e dois do Fringe. Temos comédias, homenagens, musicais e monólogos para todos os gostos, com entradas a partir de R$ 10.

Escolha o que mais te agrada e bom espetáculo!

PS: Para a programação completa, que inclui ainda as mostras Fringe, Risorama, Guritiba, Mish Mash e Gastronomix, acesse: https://festivaldecuritiba.com.br/

 Abujamra Presente

Definida como um recorte, uma colcha de retalhos exorbitante de alguns momentos significativos dos dez anos que Abujamra esteve a frente da Companhia Os Fodidos Privilegiados, um espetáculo feito especialmente para a programação da exposição sobre ele, “Rigor e Caos” no Sesc Ipiranga. Contém cenas de nudez.

Ficha Técnica

Direção Geral: João Fonseca

Texto: Ariano Suassuna, Nelson Rodrigues, Bertold Brecht, Rafael Alberti

Roteirizado por: João Fonseca

Elenco: André Abujamra, Guta Stresser e grande elenco

 Serviço

30/03 (Sábado) às 21h no Teatro Guairinha

31/03 (Domingo) às 19h no Teatro Guairinha

Elza (Musical)

Uma homenagem à cantora Elza Soares. No palco, as múltiplas facetas de Elza e as reviravoltas de sua vida são mostradas no texto de Vinicius Calderoni. Larissa Luz, Janamô, Júlia Tizumba, Késia Estácio, Krystal, Laís Lacorte e Verônica Bonfim dão vida às músicas, cujos arranjos foram criados pelo baiano Letieres Leite. Canções como “Lama”, “O Meu Guri”, “A Carne”, “Se Acaso Você Chegasse”, entre outras, fazem parte do repertório.

Ficha Técnica

Elenco: Janamô, Júlia Tizumba, Késia Estácio, Khrystal, Laís Lacôrte, Verônica Bonfim. Atriz Convidada: Larissa Luz

Direção: Duda Maia

Texto: Vinícius Calderoni

Direção Musical: Pedro Luís, Larissa Luz e Antônia Adnet

 Serviço

05/04 (Sexta) às 21h no Guairão

06/04 (Sábado) às 21h no Guairão

Navalha na Carne – Uma Homenagem a Tônia Carrero

Neusa Sueli é uma prostituta decadente e explorada por Vado. Em meio a brigas e desavenças, ela vai às ruas para ganhar dinheiro, enquanto Vado sai com outras mulheres e leva a vida sossegado.  Escrita por Plínio Marcos em plena ditadura militar, “Navalha na Carne” é contundente, visceral, violento, patético, poético e humano.  A peça foi proibida na época da ditadura militar. Tônia Carrero conseguiu a liberação e produziu, há exatos 50 anos, a montagem que entrou para a história. Essa nova NAVALHA, idealizada e protagonizada por sua neta, Luisa Thiré, é uma homenagem à ela.

Ficha Técnica

Texto: Plínio Marcos

Direção: Gustavo Wabner

Elenco: Luisa Thiré, Alex Nader e Ranieri Gonzalez

Serviço

01/04 (Segunda) às 21h no Teatro Sesc da Esquina

02/04 (Terça) às 21h no Teatro Sesc da Esquina

PI – Panorâmica Insana

Prêmio APCA de melhor espetáculo de 2018, Pi – Panorâmica insana, da diretora Bia Lessa, traça um painel irônico do mundo contemporâneo. Com Cláudia Abreu, Leandra Leal, Rodrigo Pandolfo e Luiz Henrique Nogueira, a peça discute temas como indivíduo, civilização, sexualidade, política, violência, nação, miséria, riqueza, gênero e desejo. A dramaturgia do espetáculo foi concebida a partir dos ensaios e resultou numa escritura cênica não convencional, que transita entre as artes plásticas, o teatro e a dança.

Ficha Técnica

Textos de Júlia Spadaccini, Jô Bilac e André Sant’anna, com citações de Franz Kafka e Paul Auster.

Concepção, Direção Geral e Escritura Cênica: Bia Lessa.

Elenco: Cláudia Abreu, Leandra Leal, Luiz Henrique Nogueira e Rodrigo Pandolfo.

Serviço

30/03 (Sábado) às 21h no Guairão

31/03 (Domingo) às 19h no Guairão

Recital da Onça

Solo que marca a volta de Regina Casé aos palcos teatrais depois de mais de 25 anos. Sua personagem recebeu convite de Harvard para inventar um novo formato pop para palestras sobre literatura brasileira para estudantes estrangeiros. Ela precisa ensaiar suas propostas antes da viagem, a partir de textos de nossos grandes autores. “Recital da Onça” é esse “ensaio”. A plateia tem a tarefa de ajudá-la a escolher os textos mais adequados para essa missão e a enfrentar seu pavor de aeroportos, da imigração americana e do frio congelante do inverno em Harvard.

Ficha Técnica

Criação: Hermano Vianna e Regina Casé

Direção: Estevão Ciavatta & Hamilton Vaz Pereira

Elenco: Regina Casé

Serviço

28/03 (Quinta) às 21h no Guairão

29/03 (Sexta) às 21h no Guairão

Sísifo

Sísifo.gif, primeira colaboração cênica entre Gregorio Duvivier e Vinicius Calderoni, é uma investigação de como transpor para o palco a linguagem do gif e do meme.

Ficha Técnica

Elenco: Gregório Duvivier

Direção: Vinicius Calderoni

Texto: Gregório Duvivier e Vinicius Calderoni

Direção de Produção: Andréa Alves

Serviço

06/04 (Sábado) às 21h no Teatro da Reitoria (Rua 15 de Novembro, 1299)

07/04 (Domingo) às 21h no Teatro da Reitoria (Rua 15 de Novembro, 1299)

Sherazade – Fringe

No ano em que completa 14 anos de atividades, o Grupo de Teatro do Clube Curitibano estreia o espetáculo Sherazade, inspirado no clássico As Mil e Uma Noites. Essa será a 15.ª peça elaborada e apresentada pelo Grupo, e como já é tradicional as apresentações fazem parte da mostra Fringe do Festival de Teatro de Curitiba. A estreia da peça será no dia 28 de março, dois dias após a abertura do Festival, mas ultrapassa a data oficial do evento e se estende até o dia 20 de abril. Inspirada nas histórias de “As Mil e Uma Noites”, a peça Sherazade é ambientada em um tempo imemorial e em uma Pérsia fantasiosa, onírica, mágica e misteriosa, e apoiada no romance ancestral.

Ficha Técnica

Grupo de Teatro do Clube Curitibano

Dramaturgia, Cenografia E Direção: Enéas Lour

Elenco: Adriana Villar, Alexandra Mayrhofer, Ana Mary Ribas Fortes, Carlos Valente Castro Filho, Denise Ribeiro Losso, Dulce Furtado, Enéas Lour, Judith H. Mueller, Luciana Longhi, Martina Athene Mandić e Simone Nercolini.

Serviço:

Apresentações: de 28/03 a 20/04, sempre as quintas, sextas e sábados, às 20h30 (no dia 30 de março o espetáculo será exibido às 19h30).

Local: Sede Concórdia do Clube Curitibano

Ingressos: R$ 10 – valor único.

Calígula d’Albert Camus – Fringe

Perversão moral e sexual, déspota suicída e cruel; este foi o terceiro imperador romano conhecido como Calígula (12 d.C.-41 d.C.) o qual mantinha relação incestuosa com sua irmã e era falsamente bajulado pelos senadores. Sem dúvida um dos maiores textos teatrais do sec. XX por Albert Camus (Prêmio Nobel de Literatura). Interpretado pelo ator Paulo Fermiano e grande elenco,  sob direção de Edson Buen o(Melhor Direção – Gralha Azul).

Ficha Técnica

F Studios

Direção: Edson Bueno e Paulo Fermiano

Companhia: Paulo Fermiano, Roberto Bueno, Joao Paulo Moreira, Vinícius Staub, Daphne Garcez, Antonio Barros, Gessica Ferreira, Caio Pitanga, Douglas Perez, Luan Cavalcante, Snebur Otilopih, Nalah Nascimento, Joy Marcondes, Ricardo Westphalen, Felipe Ramos, Joy Marcondes, Nalah Nascimento, Gislaine de Paula Costa, Mayumi Eguchi, Fabio Cordeiro, Mayumi Eguchi.

Serviço

05/04 (Sexta) às 21h no Teatro José Maria Santos

06/04 (Sábado) às 14h no Teatro José Maria Santos

2
abr

Em cena

Neste final de semana fui assistir a dois espetáculos do Festival de Teatro de Curitiba. Gostei de ambos e curto ainda mais o clima que a cidade incorpora nesta época, com gente descolada exibindo cabelos coloridos, sotaques, estilos, esforços gigantescos para parecer cool.

Em tempos de Festival sempre me lembro de uma história contada muitíssimos anos atrás pelo Chico Pennafiel, ator e diretor de teatro com quem trabalhei no departamento de marketing de um grupo educacional. Ele fez, numa das primeiras edições do Festival, uma peça interativa numa época em que não se falava de interatividade. O Chico montou uma espécie de casa com paredes transparentes, na qual ele “morava”, no meio da Praça Santos Andrade, bem no centrão de Curitiba.

A plateia assistia ao ator acordando, comendo, lendo, fazendo nada, indo ao banheiro (tinha uma cortininha pra esconder), dormindo, vivendo. Ele me contou que uma manhã ele acordou bem cedo, tipo 6h, e colocou na vitrolinha um disco vinil do Chico Buarque com a música Valsinha. Fazia frio, a cidade estava com aquele fog londrino típico daqui. De repente, em meio ao “Um dia ele chegou tão diferente….” veio vindo um homem bem vestido, de terno e sobretudo, pasta de trabalho 007. Ele disse que, quando viu a figura, aumentou o volume da música.

O executivo, então, colocou a pastinha 007 no chão e começou, sozinho, a valsar no meio da praça. Dançou, deu rodopios, valsou com toda a emoção. “O mundo compreendeu e o dia amanheceu em paz”. E o executivo e sua pasta 007 foram embora. Ator virou plateia. Achei lindo. Deve ter sido uma das melhores cenas do Festival. Que inveja do Chico.

Beijos, Karin Villatore

1
abr

Shakespeare de graça nas praças

Foto Heloisa Rego

O Festival de Teatro de Curitiba acabou de começar e já estou adorando. Fui ver uma das peças que abria o evento, “Sua Incelença Ricardo III” no Bebedouro do Largo da Ordem. A peça era de graça, ao ar livre, para todos. Como a rapadura é doce, mas não é mole não, São Pedro não facilitou e choveu durante todo o espetáculo. Na peça os atores cantam, dançam e tocam. Mas o que me deixou emocionada mesmo foi que nem a maquiagem escorrendo do grupo potiguar, Clowns de Shakespeare, fez o espetáculo perder a magia. Com a chuva aumentando poucos desistiram de assistir porque estavam sem proteção nenhuma, muitos pais com crianças também, mas a maioria resistiu bravamente à provação. Meu entendimento de dramaturgia fica no achismo barato, mas acredito que encenar um texto de Shakespeare, misturando músicas do Queen e sotaque nordestino, embaixo de uma chuva danada, com uma platéia fiel que aplaudiu em pé segurando o guarda-chuva na mão, não é para qualquer um. Bravo!
Aí ontem desço do ônibus depois de um dia mega agitado e dou de cara com a Megera Domada sendo encenada no meio da Praça Santos Andrade. Despretensiosamente, os atores representavam praticamente só com os figurinos que vestiam e meia dúzia de improvisados objetos cênicos.  A platéia estava repleta. Eram estudantes, transeuntes, gente velha, nova, um pipoqueiro, vendedores ambulantes e a tia maluca que ta sempre ali gritando discursos apocalípticos.
Não tive como não sorrir. Fiquei pensando que bons artistas fazem um bom público. E em o que a arte não é capaz.

Cristiane Tada