Arquivos da categoria: violência

9
jul

Quem transgride quem?

Há uma verdade mais dura por trás das transgressões de crianças e adolescentes: a realidade delas e deles, tão distinta da maioria de nós.

Há cinco anos eu pesquiso essa parcela minoritária da população, milito por, com e para aqueles que possuem suas vozes silenciadas pela dominante sociedade. Dediquei boa parte dos meus anos de pesquisadora aos que necessitam da transgressão para manifestarem que também são sujeitos e sujeitas de direitos. Nos últimos dois anos eu literalmente me sujei na lama da pesquisa empírica sobre adolescentes em conflito com a lei, especificamente aqueles 1-FF7fYzx91xYUKwFOQvPxxwque cumprem medida socioeducativa de liberdade assistida ou de prestação de serviço à comunidade; conversei com eles, andei pelos bairros e comunidades onde vivem, visitei suas moradias (algumas muito precárias), presenciei alguns, ainda tão crianças e inocentes, empinando pipa (ou raia, como eles chamam), ou observei o tráfico bem em frente à porta da casa de um deles, falei com as pessoas (nem sempre eram familiares; mas, quase sempre eram monoparental) com quem moravam e, de um extremo a outro, passei por condomínios classe média para falar com algumas exceções que se envolveram em delitos. Alguns sofreram e/ou sofrem violência em casa, ou foram abandonados e outros não tinham quem sequer perguntasse “como foi seu dia na escola”.

Após as visitas, chegava em casa de alma exausta e com fome de justiça, igualdade e proteção. Chorava. Talvez seja essa a experiência que mais me permitiu conhecer e compreender realidades muito além da que eu vivencio, possibilitando tornar-me muito mais sensível ao olhar o outro.

Na disposição social e política de trancafiar os jovens e o debate (debate?) sobre a redução da maioridade penal, sobram abundantes projetos de leis alterando o Código Penal e o Estatuto da Criança e do Adolescente (logo este, que constituiu uma significativa conquista para a minoria a partir dos anos 1990, na qual começava-se a tratá-los como sujeitos de direitos e não com a higienização da população, tal como era o Código de Menores). Sobra isso, mas falta o olhar sensível e compreensivo para a realidade da maior parte desses jovens que, muitas vezes, são privados de recursos, de atenção, de amor, de família, de acesso à saúde, educação, cultura, entretenimento. Falta contemplar as localidades em que moram, falta um diálogo com eles, falta um esforço para compreender nosso sistema prisional problemático e faltam investimentos no acesso à educação e nas próprias medidas socioeducativas.

Deixo algumas problematizações que podem fazem caminhar para uma reflexão nesse momento de decisões políticas: são os adolescentes que estão em conflito com a lei ou é a lei que está em conflito com os nossos adolescentes? E quem deve ser responsabilizado pela não garantia dos direitos das crianças e dos adolescentes?

Marcielly Moresco

Foto: Nair Benedicto

30
abr

Em que ano estamos?

Nos últimos dias fomos surpreendidos com acontecimentos que nos causam estranheza, indignação, revolta, dúvidas, vergonha, enfim, uma série de sentimentos. O Paraná tem ganhado destaque na mídia nacional e internacional com notícias que mostram abuso de poder, descaso e perseguição. Mais uma vez nossos governantes menosprezam a classe dos professores que reivindica melhores condições de trabalho e, em troca, é recebida com violência. liberdade

Educadores que manifestaram em frente à Assembleia Legislativa foram enxotados com balas de borracha e bombas de efeito moral. O Paraná protagonizou um verdadeiro cenário de guerra contra uma classe que precisa ser valorizada. Estamos falando de educação! Uma bandeira levantada pelos políticos durante a campanha eleitoral e agora praticamente ignorada. É de educação que precisamos para garantir um Estado melhor para nossos filhos. Lamentável…

Durante as manifestações um cinegrafista da TV Bandeirantes foi mordido por um cão da polícia. Esses animais não são devidamente treinados para atacar ou não sob o comando do seu “parceiro de trabalho”, no caso o próprio policial? Quando digo animais, estou falando dos cães, viu? Embora nossos policiais e governantes tenham demonstrado atitudes irracionais também.

Mais uma vez um colega da imprensa foi vítima de agressão enquanto fazia o seu trabalho de registrar os fatos. E, por falar em imprensa, outro absurdo é a perseguição aos jornalistas da Gazeta do Povo e da RPC TV. Teve profissional que recebeu até ameaça de morte por investigar denúncias de pedofilia e corrupção na Receita Estadual do Paraná.

Afinal, em que ano estamos? A liberdade de imprensa não existe mais? Onde foi parar o respeito aos professores e a todos os cidadãos paranaenses que são vítimas de abusos da polícia e do governo? Ao acompanhar os noticiários parece que, realmente, voltamos ao século passado. Esse tipo de atitude é inaceitável para uma sociedade que busca fortalecer sua democracia e liberdade de expressão.

Aline Cambuy

10
dez

A barbárie continua nos estádios

brigaPor mais que tenha se tornado uma cena cada vez mais comum nos jogos de futebol, ainda fico pasma ao ver imagens como as de domingo, em que as torcidas do Atlético e do Vasco se enfrentaram como se estivessem em uma praça de guerra. Custo a aceitar que isso ainda aconteça, porque não consigo entender o que esse tipo de pessoa tem na cabeça. Seria um fanatismo desenfreado capaz de cegar qualquer percepção de certo ou errado? O jogo não deveria ser um momento de lazer e de descontração? Então, por que essas pessoas levam isso tão a sério a ponto de quase se matarem dentro de um estádio?

Talvez ninguém possa entender os motivos, até mesmo os fieis torcedores que acompanham todos os jogos do time preferido. O que não é o meu caso. Acho que essa pode ser uma das causas da minha revolta. Não sou fã de futebol, mas também não critico quem gosta – cada um com suas preferências. E por isso me pergunto: até quando isso vai acontecer? As pessoas não evoluem? Pelo menos não essas, que ferem outros por motivos totalmente banais: um jogo de futebol – é isso mesmo??

O caso aqui não deveria ser se faltou policiamento ou segurança para conter os ânimos mas, sim, a falta de cultura, educação e senso de que todos compartilhamos o mesmo planeta. Em uma sociedade normal a polícia não teria que fazer esse tipo segurança, afinal cabe às pessoas definirem o que é certo e errado. O Estado tem lá sua parcela de culpa por todo o histórico cultural, que não cabe mencionar agora. Desculpe os simpatizantes do esporte, mas acho que o problema também está em julgar tão importante uma partida de futebol, tudo gira em torno disso. Tem pessoa que prefere faltar ao trabalho ou outro compromisso importante para ir ao estádio, o que me parece uma tremenda inversão de valores. Alguém já viu briga com torcedores de vôlei ou de basquete no Brasil? Então, acho que isso já diz muito.

Luanda Fernandes

9
mai

Educação é tudo

A falta de educação das pessoas ainda me impressiona. Li ontem que quatro brasileiros foram algemados e presos pela polícia americana dentro de um Boeing 777-200, na pista do aeroporto de Miami, quando protagonizaram uma briga com socos e golpes dignos de uma luta de UFC dentro do voo 995, que fazia o trajeto Miami-São Paulo.

Tudo começou quando o avião decolou de Miami com destino a São Paulo e foi obrigado a retornar para socorrer uma passageira, também brasileira, que passava mal. Quando a aeronave estava no solo, entraram paramédicos, bombeiros e policiais para prestar atendimento à mulher e, nesse momento, dois jovens com idade entre 20 e 25 anos reclinaram seus assentos e acabaram acertando a cabeça da passageira que estava no banco de trás, deitada no colo do marido. O homem não gostou e se levantou para tirar satisfação. Começou, então, uma gritaria dentro do avião. Um terceiro rapaz, que estava sentado numa poltrona mais à frente, saiu correndo pelo corredor e deu um soco no rosto do homem que havia reclamado.

Enfim. O que me deixa extremamente indignada é que a pessoa acerta o rosto de outra que está passando mal e se acha no direito de brigar. Pior que isso, acaba envergonhando todos os brasileiros que certamente estavam no avião e que viram a cena desnecessária. Não sei o que se passou na cabeça destes cidadãos na hora, mas não é porque está voltando de um voo de Miami que se pode tudo. Aliás, hoje em dia qualquer um pode viajar para qualquer lugar. Tem promoções, passagens parceladas e albergues à disposição de todos os interessados.

A falta de educação me choca em qualquer lugar e em qualquer situação. Não importa se você tem dinheiro, se não tem, se acha que está certo ou se está de TPM. Você não tem direito de destratar quem quer que seja, independentemente da situação. Infelizmente, muitos ainda precisam aprender esta lição.

Thalita Guimarães

8
nov

Salve Geral

Não sei se é impressão minha, mas esta onda de violência em São Paulo parece estar recebendo uma cobertura cheia de dedos da nossa imprensa. As notícias aparecem de um jeitão tão maquilado que até vale uma retrospectiva que ajude a tentar entender a história.

Em 2006, uma quebradeira acionada pelo salve geral do PCC (Primeiro Comando da Capital) deixou mais de 150 mortos (entre policiais, carcerários, presos e civis inocentes), mais de 80 ônibus incendiados, quase 20 agências de banco atacadas com tiros e bombas, rebeliões em 74 cadeias, demissão do secretário da Administração Penitenciária de SP.

O episódio virou lenda entre a bandidagem, ganhou filme do Sérgio Rezende e causou síndrome do pânico pós-traumática em um monte de paulistanos.  Em 2006, a imprensa brasileira e até internacional fez um bafafá danado no relato dos atentados e, já que não tinha informação oficial, cobria o que via.  Resultado: o governo de São Paulo ameaçou abrir processo contra vários veículos de comunicação por “práticas jornalísticas abusivas”. E neste ano foi apreendida no bairro de Paraisópolis, um desses lugares cantados nos raps do Racionais, uma carta com um novo salve geral dando a ordem de que dois PMs deveriam ser executados para cada integrante do PCC morto.

Como explicou o Estadão numa das poucas matérias mais elucidativas que encontrei sobre o assunto, “era uma das peças que faltavam para ajudar a compreender as causas da atual tensão vivida em São Paulo”.  Em 2006 os ataques aconteceram de uma vez só e agora são em doses homeopáticas. E, se não vem tudo de uma vez, difícil imaginar quando vai acabar. Mas, pelo que tenho conseguido acompanhar da estranha cobertura da imprensa, neste ano os ataques se centram mais na periferia. E os jornalistas, estão esperando contar toda essa história com detalhes e clareza quando? Salve geral, colegas.

Beijos,

Karin Villatore

3
jul

Intolerância

A equipe de jornalismo da RICTV RECORD foi atacada por membros de uma suposta gangue, em Curitiba. Segundo informações divulgadas pelo Sindijor (Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Paraná), a equipe da TV estava produzindo uma reportagem no sábado (30/06), sobre uma briga que havia acontecido na noite anterior e que resultou na morte de um homem.

Os membros da suposta gangue estavam no 1º Distrito Policial de Curitiba para prestar depoimento, quando a equipe da TV chegou. Esse era o local onde o suspeito pelo crime estava detido. A agressão ao repórter e ao cinegrafista aconteceu em frente a delegacia. Além da violência, eles também depredaram o veículo da TV. A equipe registrou um Boletim de Ocorrência na própria delegacia.

O que espanta, é que parece que ninguém dá muito atenção a esse tipo de ocorrência, não somente pelo fato da equipe ter sido agredida, mas por ainda convivermos com grupos de intolerância racial. Esse assunto fica meio obscuro, até mesmo na imprensa, pois ninguém confirma que existam esses grupos e o que eles realmente fazem, mas a maioria da população sabe que eles existem e que circulam normalmente pela rua. Parece que a humanidade ainda precisa amadurecer muito, até realmente aprender a lidar e conviver com as diferenças sejam de raça, de credo ou de escolha sexual.

Luanda Fernandes

9
abr

190

Não são somente os curitibanos que estão percebendo o aumento da violência na cidade. Este fato já vem sendo noticiado nacionalmente há muito tempo. Em pouco mais de dez anos, a violência explodiu na capital paranaense. A pesquisa Mapa da Violência 2012, divulgada pelo Instituto Sangari, que realiza esse levantamento desde 1998, mostrou que, em dez anos, Curitiba saltou da vigésima para a sexta posição no ranking das capitais com maiores índices de homicídios. Em 2000, a sexta posição era ocupada pelo Rio de Janeiro, mas graças a ações eficazes de combate à violência na nova pesquisa o Rio desceu para o 23.° lugar, já Curitiba…

Sabe aquela expressão “só rezando mesmo”. Uso ela todos os dias porque muitas vezes a proteção da polícia deixou, e muito, a desejar para mim. Um exemplo disso foi uma ligação que tentei fazer para o 190 na sexta-feira, que era Santa. Moro ao lado de um hospital e lá pela 01h da madrugada um grupo para em frente a este estabelecimento, aumenta o som, sai do carro para dançar e, não satisfeitos, ficam buzinando, tentando de alguma forma acompanhar o ritmo da música. Eu não estava dormindo e até não estava me incomodando tanto, mas e a falta de respeito com os doentes no hospital? O segurança saiu e tentou mostrar que ali era uma área que merecia silêncio, mas de nada adiantou.

Foi neste momento que resolvi ligar para o 190 e pedir ajuda com a situação. Veja, eu não estava sendo assaltada, roubada ou precisando de socorro imediato. Ainda bem. Porque se estivesse precisando, poderia estar morta. Isso porque na primeira tentativa fiquei exatos 15 minutos esperando alguém me atender quando simplesmente a ligação caiu. Mas não desisti. Na segunda tentativa fiquei mais 10 minutos e, para minha surpresa, caiu de novo. Na terceira, depois de mais 15 minutos, desisti. O hospital que tomasse uma providência.

Confesso que fiquei frustrada. Claro que a polícia tem coisa muito mais importante para defender, mas e se este fosse o meu caso? Talvez também se tivesse feito algo sobre o desentendimento por causa de barulho no bairro Água Verde um jovem não estaria morto e um culpado solto por aí. Mas assim caminha a humanidade. Infelizmente.

Thalita Guimarães