2
dez

Os antenados

cor

Eles não nos dão paz, não nos deixam ter alegrias pueris, dessas que sentimos ao contar uma novidade.

Você descobre uma loja barateza e o antenado já comprou lá, mas sabe de outra ainda melhor e você fica se achando meio trouxa.

Em viagem, você faz fotos na praia mais bonita que já se viu, mas o antenado corre pra perguntar se você foi nas maravilhosas ruínas que ficam lá naquele morro não sei das quantas.

É claro que você não foi, nem viu as velhas termas em que os gregos e os romanos viveram os dias mais sexies da humanidade. Perdeu, já voltou pra casa fazendo cara de tô nem aí, mas se roendo por dentro.

O antenado sabe o nome, a marca e o princípio ativo do remédio mais moderno e eficaz para retardar o envelhecimento da pele, o entupimento das artérias, a decadência dos hormônios e a unha encravada.

E você, que estava tão feliz tomando uns florais e usando umas pomadinhas, percebe que dá largas e desatualizadas passadas em direção à ruína física e mental.

Os não antenados lêem livros, vêem filmes e se divertem com séries na Netflix. Coitados, nem imaginam que os antenados já superaram essas velhas mídias.

E lá vêm eles com tecnologias das quais você nunca ouviu falar, serviços de streaming impronunciáveis e – pior – autores, diretores e atores que circulam num futurístico Olimpo das artes. Coisa para antenados, apenas.

Meu Deus, nem vamos falar de vinho, café, queijo, cremes, perfumes, música, crianças, pets, redes sociais e, até, á-gua-mi-ne-ral (?!?)…

Eu não odeio os antenados. Ao contrário. Tenho amigos e amigas que sempre sabem das últimas, enquanto eu ainda ando pelas antepenúltimas.

Também não invejo os antenados. Mas às vezes me dá uma raivinha por nunca conseguir contar uma novidade. Você não dá furo com um antenado por perto. E o bom e antiquado furo é bálsamo para a alma de velhos jornalistas.

Antenados das minhas relações, ao lerem esse pequeno desabafo, darão um jeito de fazer chegar aos meus ouvidos que essa tribo nem existe mais. Antenado é vocábulo superado, assim como ligado e conectado (sim, fui ao dicionário buscar sinônimos).

Do que devemos chamá-los, então? Trend designers, cool hunters, chatos de galocha, desmancha-prazeres…? Completem a lista aí, enquanto me recolho ao meu mundinho old school.

Dia desses, quem sabe, consigo dar um nó num antenado, nem que seja inventando.

(A propósito, sabiam que a Pantone escolheu as cores azul e verde para 2020?)

Beijos ressentidos,

Marisa

21
nov

Terapia

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Sempre que alguém chega para mim com uma situação impossível de resolver ou um trauma daqueles de desgraçar a cabeça, eu indico terapia. Sempre que alguém se sente confuso, perdido ou muito triste, eu indico terapia. Eu indico terapia para o meu pai. Eu indico psicólogos. Eu passo telefone. Eu falo sobre como a terapia é benéfica e poderia resolver todos os nossos problemas. Mas euzinho mesmo nunca fiz terapia. Eu, não. Eu era um grande e gostoso de um hipócrita.

Não mais. Comecei terapia.

Eu relutava. Relutava por que tinha fechado a minha torneira de emoções há muito tempo. Sempre que alguém pedia para contar sobre a minha vida ou como eu estava naquele momento, eu fazia manobras na conversa que até Freud ficaria admirado, tudo apenas para que a pessoa continuasse a falar dela e não de mim. Como as pessoas adoram falar sobre elas mesmas, nem era tão difícil.

Por anos foi assim. Há anos sofro com uma ansiedade que não me larga. Há anos antecipo problemas e destruo momentos. Há anos reprimo sentimentos felizes porque eu sou uma pessoa contida. Há anos eu construo dentro de mim uma baixa autoestima que, menina do céu, é paralisante. Mas eu disfarço com piadas, ironias e autodepreciação, porque é muito melhor ser negativo. A positividade irrita.

Mas isso está ficando no passado. Aos poucos, bem aos pouquinhos.

Logo na segunda sessão de terapia eu tive que escrever uma carta fictícia me apresentando para alguém que não me conhecia. Fui sincerão no texto e me expus quase que completamente. Eu só não contava que a minha terapeuta iria ler a carta em voz alta. Foi um choque, porque constatei que eu sou carinhoso com muita gente, menos comigo. Aliás, eu sou extremamente tóxico comigo mesmo.

Mas a questão é que somente agora eu estou conseguindo organizar as ideias e entender como eu me vejo, me comporto e me sinto perante várias situações da vida. Somente depois de começar terapia eu percebo que aquilo lá que aconteceu em 1996 e que eu contava como se fosse piada, na verdade me moldou de uma maneira que eu jamais tinha imaginado. Aquele fato em 2011 fez eu mudar de uma maneira irreversível. Aquela frase ouvida me mudou para melhor. Aquela outra frase me destruiu.

Mas só agora eu consigo analisar coisas que sozinho eu não conseguiria. Só agora eu tento olhar para quem eu sou hoje de uma maneira mais delicada. Porque tem coisas que a gente não consegue analisar sozinho, por mais que a gente ache que sim. Somos muito teimosos.

No fim, o que todos nós precisamos é de terapia, e eu gostaria de pagar um terapeuta para todo mundo, porque só assim seria possível parar de fazer terapia, já que só sentamos no divã porque os outros não fazem terapia. É isso. É um ciclo horroroso.

Cada um de nós carrega aquele símbolo de frágil na testa, mas a gente esconde e os outros fingem que não carregam. Tá certo que todos nós passamos por poucas e boas nessa estrada da vida, e com isso acabamos vestindo uma certa resiliência, mas isso não quer dizer que as coisas não se quebrem dentro de nós. E aí ninguém se preocupa com a dor e a bagagem do outro. Saem empurrando e derrubando sem o menor cuidado com o próximo. A grosseria anda sendo glamourizada e aí, meu amigo, é um festival de traumas e cabeças perturbadas passando por nós. Só a terapia salva.

Beijos

Rodrigo de Lorenzi

13
nov

Vida de noivo

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2019 ainda não acabou, mas já está marcado para sempre. Pode ser clichê, o que é inevitável quando se fala de ocasiões marcantes como formaturas, nascimentos e casamentos. Pois é, casei!
Expectativa e planejamento que duraram mais de um ano, nessa vida de noivo até a chegada do aguardado 5 de outubro. Felizmente, tudo correu bem, os convidados ficaram satisfeitos com a festa, os “comes e bebes”, DJ, equipe de foto/vídeo super elogiada e recomendada, e por aí vai.
E até que não passou tão rápido, viu? Realmente é o que dizem: aproveite cada etapa dos preparativos, pois depois é só um dia de festa e emoção!
Vida de noivo é bem legal: tem feiras para visitar, provas de comidas e drinks a vontade, e muitos, muitos orçamentos dos mais variados fornecedores. E os atrativos só aumentam, de drones a aparatos tecnológicos para ampliar o encanto das bodas.
É um mercado movimentado, que nunca para. Estima-se que 400 casamentos/ celebrações/ festas são celebrados em Curitiba a cada final de semana, durante o ano todo! Nunca ouvem falar de crise…
Depois de 14 meses como noivo, teve início a vida de casado, com todas as alegrias e desafios diários. Mas isso fica para outro texto 😉

André Nunes

30
out

4 lugares inusitados para conhecer em Curitiba

 

Jardim Botânico, Parque Barigui, Museu Oscar Niemeyer… estes são alguns dos cartões-postais de Curitiba mais visitados pelos turistas e amados pelos curitibanos. Mas a capital paranaense abriga experiências fantásticas que são pouco conhecidas até entre os moradores da cidade.

Na lista abaixo abaixo, selecionei locais fora do circuito turístico tradicional de Curitiba que valem a visita. Inspire-se para fazer um programa fora do óbvio, seja você morador ou visitante:

Bosque Capão da Imbuia

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Como o Bosque Capão da Imbuia é pequeno e fora da área central da cidade, acaba não recebendo tantas visitas em relação aos parques famosos da cidade. Mas vale a pena conhecer o espaço, que é extremamente bonito – e muito especial para mim. Morei a maior parte da minha vida no Capão da Imbuia, e as visitas ao bosque eram rotina desde que eu era criança.

Ao contrário dos parques mais populares da cidade, o bosque costuma ser bem silencioso, ótimo para caminhar, sentir o cheirinho da mata, ouvir os sons dos pássaros e observar as cutias que sempre aparecem por lá, entre as folhas.

Biblioteca do Paço da Liberdade

O Paço da Liberdade é uma jóia arquitetônica de Curitiba. Lindo por fora, o edifício também guarda experiências muito bacanas por dentro: o espaço conta com um café, um espaço expositivo e salas que abrigam diversos eventos culturais.

Mas neste texto meu foco é a biblioteca do Paço da Liberdade. Em pleno centro de Curitiba, ali é um local onde é possível se desligar do entorno movimentado, entre centenas de livros e as últimas edições de revistas e jornais. Tudo em um ambiente extremamente belo e confortável.

Santuário de Schoenstatt

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pura paz 🌿

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O Santuário de Schoenstatt é um dos lugares mais bonitos de Curitiba na minha opinião. Localizado no bairro Campo Comprido, o santuário é rodeado por um bosque com muito verde e banquinhos para contemplação. A atmosfera é tranquila e pacífica, dá vontade de passar horas ali.

Mercado das Pulgas

Se você gostar de antiguidades tanto quanto eu, certamente se encantará pelo Mercado das Pulgas de Curitiba. São 3 mil metros quadrados com mais de 100 mil itens de outras épocas, incluindo obras de arte, lustres, cristais, pratarias e móveis. Mais do que uma loja de velharias, o Mercado das Pulgas é um verdadeiro museu de objetos interessantes e inusitados.

Espero que tenha gostado das dicas!

Bom passeio,

Stephanie D’Ornelas

18
out

Sextar ou não sextar? Eis a questão

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Hoje foi um dia atípico. A começar pelo fato de que acordei e logo levantei da cama. Me troquei sem reclamar da vida e desci rapidamente para tomar café e arrumar a marmita para mais um dia de trabalho. É sexta-feira e o meu “sextou” de hoje vem na forma de um livro. Mas não é um livro qualquer. Poderia ser Agatha Christie, J. K. Rowling ou até John Green (ou não), mas é de um autor até então desconhecido. O autor sou eu.

Talvez você possa estar pensando: “Mas quem é esse cara? Já chega fazendo propaganda e, o que é pior, falando de si na terceira pessoa!”. Pode até ser que seja verdade, mas deixa eu contar o porquê de tudo, juro que você vai entender.

Eu sempre tive dificuldade de terminar as coisas na minha vida. Fui aquela criança que fez aula de violão, judô, inglês, natação e futsal, só para, na fase adulta, fazer curso de mecânica de automóveis a distância, ler apostila de síndico profissional de condomínio e aprender a fazer uma pizza como os melhores pizzaiolos. Já escrevi aqui sobre os diversos cursos que comecei e não terminei e que me trouxeram ao jornalismo. Pois bem, este livro é a realização de tudo o que eu imaginava quando era pequeno. E ponto.

Eu sempre quis tocar a vida das pessoas de alguma forma. Sempre gostei de olhar a reação dos meus pais e familiares quando eu entregava uma cartinha de presente ou algo que eu havia escrito. Sempre busquei o riso, a lágrima, a empatia… e foi a concretização desses sentimentos que eu fui buscar na gráfica nesta sexta-feira atípica.

Quando saí de lá com os quatro volumes, o coração acelerando, as mãos suando e o guardador de carro gritando: “Vai querer um estar aí?!”, foi quando eu percebi que não quero que esta sensação acabe nunca.

Ah, mas se você leu até aqui, deve estar se perguntando que obra-prima é essa capaz de causar tantos sentimentos e trazer tantos louros. Pois eu conto, querido incrédulo. O meu livro, que tanto adorei chamar de meu, conta histórias de recuperação da doença da adicção e de dependentes químicos que, de alguma forma, construíram sua história de sucesso.

Digo que talvez eu não possa chamar o livro de meu por que acredito que ele seja mais das pessoas que o construíram. Digo que construíram uma história de sucesso por que a nossa sociedade diz tanto sobre um ideal de pessoa bem-sucedida que de forma alguma consideraríamos uma pessoa que usou drogas a vida inteira, morou na rua e roubou dinheiro da bolsa da mãe como um cidadão pleno e próspero.

Nenhuma criança diz que quer ser adicta quando crescer. Que quer sofrer preconceitos e ver suas possibilidades de vida serem extinguidas rapidamente por uma doença impossibilitante e debilitante, que humilha e rebaixa o ser humano a algo pouco mais do que um animal. Porém, um adicto limpo, um dia que seja, é uma história de sucesso. Para alguém que não ficava 24 horas sem usar nenhum tipo de substância que alterasse a mente, corpo e espírito, não usar é a maior história de uma pessoa bem-sucedida.

Um dos personagens do meu livro (olha aí o pronome possessivo novamente) disse que a vida é feita de momentos, uns bons e outros ruins, uns felizes e outros tristes, e temos que ter o discernimento de enfrascar os momentos bons para que, nas horas difíceis, possamos nos refrescar relembrando do perfume da alegria novamente. Então, meu caro crítico, deixe-me ser feliz com os meus cinco minutos de fama e poder dizer, finalmente, que sextou.

Lucas Jensen

10
out

Apenas o que realmente importa

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Não perco mais meu tempo com coisas que não interessam. Não sofro mais quando alguém não vibra comigo por uma conquista que para mim é importante ou quando não quer ir ao meu restaurante favorito, pois prefere outro. Aprendi a respeitar as diferenças, as individualidades e as preferências de cada um. E isso me fez tão bem! Principalmente porque aprendi a respeitar as minhas vontades também.

Estou sempre disposta a ouvir sobre as angústias e as alegrias dos outros, mas hoje ouço sem opinião ou julgamento. Sei que nem sempre as pessoas querem um conselho, às vezes precisam apenas serem ouvidas. Só expresso a minha opinião quando solicitada.

Ainda tenho uma longa caminhada de aprendizados pela frente, mas fico feliz sempre que percebo que a vida me mostra novas possibilidades para evoluir.  E assim seguimos, aprendendo sempre.

 

Aline Cambuy

20
set

A arte de falar do que não se sabe

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Acho engraçado quando alguém vem e pergunta: “você que é jornalista, o que acha de ___________________?” (preencha aqui o que mais lhe aprouver: liberação de drogas, aborto, a crise na Chechênia, sexo na adolescência, hospital veterinário gratuito, produção de energia elétrica em usinas eólicas, etc). Parece que com o diploma adquirido na universidade (que nem é mais obrigatório) a gente ganha o superpoder de entender de tudo e ter opiniões interessantes, relevantes e fora do comum.

Veja bem: não estou dizendo que a gente pode ser jornalista sem repertório, mas há temas aos quais somos mais afeitos e até especializados: o Rodrigo, aqui na agência, conhece muito de séries e filmes; a Marisa entende de economia; a Stephanie manda muito bem em pautas de arquitetura e design; o André é um conhecedor de Curitiba e de novelas; a Aline parece saber um pouco de tudo, mas lembro que entendia muito de transporte; e o Lucas manja de música e cultura geek.

E eu? Meu forte digo que seriam as pautas de cultura: tive a sorte de frequentar teatro desde pequena (obrigado, mãe), entrevistar grandes artistas na ÓTV e na Gazeta do Povo e fazer a assessoria de grandes festivais: estive em três edições do Festival de Teatro de Curitiba e no Psicodália — saudades. Também participei da produção de muitos eventos culturais como shows e peças de teatro, além de me interessar pelo tema, o que me deu a chance de me aprofundar um pouco.

Mas aí você se pergunta: e como ela atende um cliente que produz peças para motocicletas? E eu te respondo: é porque a gente não sabe, mas conhece quem sabe. E essa é a importância de se ter boas fontes. A gente também pesquisa muito: é importante buscar conteúdo de qualidade e não a primeira página que aparece no Google. Foi assim que eu escrevi um e-book inteiro sobre cabeamento de usinas eólicas: entrevistando um engenheiro especializado e traduzindo muito conteúdo confiável do inglês — essa é uma ótima dica para quem produz conteúdo, procure fontes em outras línguas também!

Então, para falar do que você não sabe, você precisa: ir atrás de quem sabe; como diz o E.T. Bilú, busque conhecimento! Não vale o primeiro link que você encontrar, cheque a fonte; e não tenha vergonha de perguntar. Agora, sobre a crise na Chechênia, me desculpe, eu não tenho a menor ideia de como estão as coisas por lá!

9
set

Eu não disse não

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Tenho dificuldades para dizer não em situações que me desafiam. Isso não é uma qualidade, frequentemente deu errado e algumas vezes consegui me safar com poucos danos.

Podia ter me dado bem mal quando apliquei uma benzetacil no meu primeiro chefe. As variáveis eram assustadoras, mas a ignorância dá coragem. Então, sem nunca ter treinado sequer em uma maçã, misturei os birinaites da injeção mais doída do planeta e mandei brasa no braço da pessoa – que ainda agradeceu!

Nem vou desfilar aqui os muitos casos de minha insensatez – a maioria deles não merece vir a público por que ainda tenho alguma reputação a salvar.

Mas foi por sofrer dessa incontinência que neste ano corri o maior dos riscos para uma pessoa de vidinha mediana e medíocre como a minha. Fui parar em cima de um palco, cantando, dançando e representando. Quer dizer, tentando fazer tudo isso.

Claro está que não sou a única pessoa sem juízo na cidade. Eu era uma em um grupo de 29 amadores. Nossa sorte e fortuna residem no profissionalismo do maestro que nos deu essa missão.

Ele apostou no grupo e confiou que faríamos – não sem acionar o chicotinho, é claro, que nada vem de graça nessa vida; muito menos encenar uma versão da “Ópera do Malandro” num teatro lotado por 650 pessoas.

Parafraseio um dos antológicos versos do Chico Buarque para dizer como me sinto em relação a essa aventura: na vida, ou nos palcos da vida, a gente vai apanhar e sangrar e suar. E vai ser maravilhoso!

 

Marisa Valério

30
ago

Vai fazer faculdade de quê?

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Quando era adolescente me deparei com aquela fase do “vai fazer faculdade de quê?”. Eu, no auge dos meus 16 anos, adorava escrever. Tinha até um Tumblr. Porém, os anos foram passando, os vestibulares se acumulando e os cursos que eu decidi não fazer, também. Desde Relações Públicas, passando por Psicologia e Cinema, até chegar nos cursinhos preparatórios para concurso… Fiz de tudo. Mas cheguei num ponto em que já não queria mais fazer um curso superior.

Mais anos foram passando. Trabalhei com várias coisas e em vários lugares, só para voltar ao ponto de partida: o Jornalismo. Antes de todos os cursos, vestibulares e faculdades que decidi fazer, a ideia era ser jornalista. “Não esses de redação”, eu dizia, por medo de achar muito chato. Só queria escrever. Mas, além disso, queria que as pessoas “me lessem”.

Hoje, depois de quase quatro anos na faculdade de Jornalismo, estou em processo de finalização de um livro-reportagem e da concretização desse sonho de “me lerem”. Era o que eu sempre quis, não era? Mas, ansioso que sempre fui, já comecei a imaginar, pensar e conjecturar sobre como será a vida pós-acadêmica. Como sempre também adorei começar projetos novos (terminar já são outros quinhentos), já organizei todo o meu tempo para fazer cursos, outras faculdades, pós-graduações, mestrados e doutorados, até o longínquo tempo da velhice. Besteira? Talvez.

Eu sempre vivi a vida, como gostava de dizer, “sem planejar”. Fazia o que dava na telha, quando dava na telha e com quem dava na telha. Por isso comecei uma faculdade só aos 24 anos, por isso tenho tantos cursos e formações inacabados e projetos começados não terminados. Não vou aqui colocar o velho clichê de que “tudo tem o seu tempo”, e que “nos forçam a decidir nossas carreiras muito cedo”. Todos sabem disso. O que estou querendo dizer é que um pouco de planejamento sempre cai bem. Um pouco não, quiçá bastante.

O meu livro-reportagem é um compilado de relatos-testemunhos de pessoas em recuperação da doença da adicção, ou dependência química se preferir. Várias delas, além de acompanhamento psicológico ou psiquiátrico, frequentam assiduamente grupos de mútua ajuda como Alcoólicos Anônimos e Narcóticos Anônimos. Um dos dizeres comuns nesses grupos é o “só por hoje”, que significa nada menos do que viver um dia de cada vez. Se você pensar bem, é extremamente libertador viver sem se sentir amargurado pelo passado e ansioso pelo amanhã, só no momento presente. Mas… e o planejamento, onde fica? E os sonhos? Será que não posso mais sonhar se escolher viver assim? Que vida horrível!

Calma! Eu também tive essa dúvida e, digo com facilidade, que podemos e devemos ter planos. O “só por hoje” é ótimo para determinadas situações em que ficamos pensando muito à frente ou nos perdemos no passado. Porém, usar essa “técnica” ou filosofia para tudo é extremamente prejudicial para o longo prazo necessário para a vida. Qual é a solução então? Fui perguntar, óbvio, para aqueles membros que já estão em recuperação há mais tempo: “Como você faz para planejar a sua vida e ainda sim viver essa filosofia?”.

A resposta me chocou. Não tinha imaginado que uma coisa não precisa necessariamente anular a outra. Viver no momento presente e fazer o que me cabe no dia de hoje para que meus planos futuros possam se concretizar é a chave do sucesso. Quem disse que uma pessoa precisa ser uma coisa só, ainda mais para o resto da vida? Eu não. Prefiro ser, como diria Raul Seixas, essa metamorfose ambulante.

Lucas Jensen

22
ago

Desenhe pelo desenho

 desenhe

Minha relação com as letras sempre foi próxima. Na infância amava ler gibis, depois passei para as revistas e livros. Redação era minha matéria preferida na escola e, como decidi ser jornalista, continuei usando as palavras para expressar minhas ideias do cotidiano ao ganha-pão. Quando eu era criança também gostava de desenhar, e até achava que tinha potencial para isso, mas com o passar dos anos deixei de me dedicar à arte da representação gráfica. Foi quando comecei a fazer a faculdade de Design Gráfico, no início deste ano, que o desenho renasceu na minha vida.

Cheguei com travas — ainda não totalmente desbloqueadas — por pensar que talvez minha habilidade como desenhista não fosse suficiente para o curso. Eu não estava sozinha. São muitos os estudantes que iniciam a faculdade nesta área sem confiar plenamente em seu potencial para o desenho.

Quando somos crianças, amamos criar universos com lápis de cor, giz de cera, canetinhas e tudo o que produzir manchas coloridas num papel (ou mesmo numa parede que estiver dando sopa). Mas, por algum motivo, grande parte de nós cresce acompanhado das neuroses que nos sussurram de que não sabemos desenhar ou que somos pouco criativos.

Dias atrás vi uma postagem em uma rede social de um ilustrador que admiro muito dizendo que ele tinha se tornado desenhista porque foi uma criança que nunca disse a si mesmo que não sabia desenhar. São muitos os relatos de crianças que são corrigidas por pais e professores por colorirem uma imagem com as “cores erradas”, por que, teoricamente, as tonalidades escolhidas não representam a realidade.

No século passado, o icônico cachimbo do surrealista René Magritte dava a dica:

“ceci n’est pas une pipe” ou, no português, “isso não é um cachimbo”. As imagens não são a realidade em si. Mesmo assim, a sociedade continua podando o modo como as crianças desenham, até que todas se encaixem em um padrão e que muitas cresçam achando que o desenho não é para elas.

Outro grande obstáculo é acreditar que o desenho só deve ser feito para alcançar um fim específico. Colocamos tanta expectativa no resultado final que o processo se torna muito intelectual e pouco prático. Tenho aprendido a simplesmente desenhar por desenhar. Aproveitar o processo. Em uma aula da faculdade, uma aluna perguntou ao professor se um trabalho de ilustração que faríamos em sala seria apenas um esboço ou se já deveríamos nos preparar para entregar no mesmo dia. Ele explicou que, para ele, tudo era o resultado final: desde os nossos primeiros traços.

Se você quer começar a desenhar, não pense muito: apenas desenhe. E se você não estiver satisfeito com o resultado, continue desenhando. Todos os grandes desenhistas têm anos de prática e dedicação. Livrar-se das amarras tem sido, para mim, um processo maravilhoso de redescoberta de mim mesma. Afinal, desenhar apenas pelo ato de desenhar é uma forma de expressão tão forte quanto as palavras.

Stephanie D’Ornelas